domingo, 8 de abril de 2012

Criança incorrigível

Quando eu era pequenina não havia Bershka, não havia telemóveis, não havia hipermercados nem centros comerciais com o tamanho de estádios de futebol. Quando eu era pequenina o taxista dizia "a menina agarre-se que já vamos a 60km/h", o leite vinha da vaca e era fervido assim que chegava à cozinha, as casas tinham soalhos de madeira encerada, os 3 meses de férias eram passados entre idas à praia e invenções de túneis secretos à volta da vila onde explorávamos aventuras e enredos.


A mãe tricotava-me casacos e camisolas que copiava de revistas e depois, com os restos dos novelos, fazia igual para as minhas bonecas. Eu tinha uma Barbie, dois bebés que tinham sido comprados em Espanha, uma casa de bonecas encomendada ao carpinteiro local, um balde cheio de Lego, um berço em verga adquirido na viagem à Madeira e alguns electrodomésticos em miniatura que funcionavam a pilhas e faziam as delícias das amigas. Quando a Barbie sofria acidentes ou a máquina de lavar roupa se desmanchava acusando cansaço, ficava à espera de uma ida a Lisboa para poder entregar o brinquedo no Hospital de Bonecas (na Praça da Figueira).


Não havia factores de protecção solar, não havia laptops nem Multibanco. Quando eu era pequenina havia os Porfírios, o centro comercial Apolo 70 e uma estrada demasiado enjoativa e demorada entre a vila e a capital. O tempo chegava para tudo. Num só dia tinha tempo para ir à escola, para fazer os t.p.c., para brincar com os amigos na rua antes do jantar e para ver televisão antes de ir dormir. Havia tempo para passear aos fins-de-semana e feriados, para ir conhecer mosteiros, museus e pelourinhos. Quando eu era pequenina nunca estava demasiado frio nem demasiado quente e as Estações cumpriam com o calendário, a música vinha em LP ou single de vinil ou então, em cassetes que volta e meia se desenrolavam dentro do leitor. Era prática comum gravar as músicas à medida que passavam na rádio, com um dedo encostado ao botão do stop, pronto a interromper a gravação ao mínimo sinal de publicidade.


Era popular quem tinha muitos discos, quem fazia matinés na arrecadação da avó e quem tinha as calças à boca-de-sino. Lembro-me de as mandar apertar na modista e de ter que me deitar de barriga para cima para conseguir fechar a braguilha. Quando eu era pequenina era maria-rapaz, requisitava livros na biblioteca itinerante, fazia teatro amador no Clube Recreativo, praticava Judo e desenhava roupas que depois recortava e colocava em bonecas de cartolina. 

Para celebrar a menina que há em todas as mulheres, e tendo o my OutaThisWorld planner como versão moderna das bonecas de papel, esta semana é inteiramente dedicada à Bainha de Copas. Espero que gostem!

Beijinhos.
Marina



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